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sábado, 23 de abril de 2016

O arquivo

    O arquivo morto é a parte mais esquecida da escola. Não é a toa que recebe o nome de morto.
    No colégio onde trabalho não é mais assim. Um esforço coletivo da equipe administrativa deu vida e visibilidade ao morto. O arquivo recebeu outro nome, passou a se chamar Inativo e ter importância significativa no desempenho do atendimento a comunidade e na facilidade de arquivamento de dados dos estudantes e funcionários.
    Não foi uma tarefa fácil reorganizar o morto, afinal, morto é um ser sem vida, que tem valor simbólico, enquanto que inativo é um ser vivo, plenamente capaz de regressar a  escola e retomar seus estudos. Inativo também é um ser que ultrapassou todos os degraus na escola, esta em plena atividade educacional, talvez numa faculdade, noutra escola, sempre desempenhado seu papel na sociedade.
    Por exemplo, no arquivo inativo tem a pasta de um líder do movimento negro de Curitiba que realiza um trabalho importante na emancipação dessa classe social; tem a pasta do presidente de uma grande empresa de Curitiba; do diretor do colégio, de agentes educacionais, servidores do Estado, e por ai segue... enfim, o arquivo é significante, conta historia de vidas que abstraíram as dificuldades do dia-a-dia, as derrotas da vida e transformaram tudo em valores essenciais para vitoria pessoal.
    O arquivo morto era um grande numero de gavetas metálicas que sempre emperravam e causava acidentes de trabalho. Todos os companheiros e companheiras da equipe administrativa tiveram cortes nas mãos causados por partes cortantes daquelas gavetas. Emperradas, elas necessitavam de esforço físico descomunal, irritando a paciência e a coluna dos funcionários.
    Agora é tudo diferente. Sem gavetas metálicas, as quais são ecologicamente incorretas, usa-se caixas de papel que podem ser recicladas. No lugar da aventura de abrir e fechar gavetas em busca de uma ordem alfabética, basta um “CTRL F” num arquivo XLS e pronto. Localiza-se em segundos a informação desejada.
    Nos seus tantos anos de história o colégio tem milhares de indivíduos que adquiriram a cidadania, condição de cidadãos, com a contribuição dessa escola. Alguns estudaram por alguns meses, outros por um ou dois anos, muitos até dez anos, mas a maioria completou o ciclo da educação básica cursando séries do antigo primário, hoje ensino fundamental, e do antigo segundo grau, atual ensino médio.
    O arquivo inativo da escola guarda ainda outras histórias essenciais para o entendimento do que é uma comunidade. Algumas prateleiras parecem bocas abertas e sorridentes à contar que homens e mulheres aprenderam oficios em cursos técnicos e estão operando fábricas, indústrias e o comércio da cidade. Outros estão nas mais diversas áreas do serviço público à serviço da qualidade de vida das pessoas.
    Sem mais delongas, jovens e adultos que estavam ausentes, excluídos da vida escolar, tiveram e aproveitaram a oportunidade de retornar a vida estudantil. Venceram o estigma da incapacidade de aprender e tambem são lembrados no arquivo inativo.

    

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