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segunda-feira, 11 de abril de 2016

missão mst



                Terça-feira, 02 de maio de 2000. Oito horas e trinta minutos da manhã.
                Toca o telefone, eu atendo.
                Quem liga é um amigo, parceiro das lutas sociais nos movimentos populares de Curitiba.
                - Bom dia Zequinha, tudo bem?
                Ele sempre me chamou pelo apelido.
                - Bom dia, como está?
                - Estou bem, mas triste e é por isso que estou ligando pra você.
                Perguntei a ele:
                - Que houve meu amigo?
                - Cara, aconteceu uma tragédia. A Polícia Militar interceptou vários ônibus do MST agora pouco e houve confronto. Tem muita gente ferida e fala-se em mortos.
                Perguntei:
                - Mas onde aconteceu isso?
                - Na verdade está acontecendo. É entre Campo Largo e Curitiba, perto de Balsa Nova, na BR 277.
                Eu repliquei:
                - Nossa Senhora! Os sem-terra estavam vindo pra Curitiba?
                - Sim. Iam protestar frente ao Incra, pedir mais empenho do governo com a reforma agrária.
                - E agora?
                - Olha, parte dos trabalhadores estão fugindo pelo mato em direção de Balsa Nova onde tem um acampamento. Tem muitos feridos e precisam de remédios, comida e roupa.
                - Sei!
                - Precisamos de alguém pra ir lá. Só que a polícia está bloqueando toda a região e vai impedir a chegada de carro até eles.
                - Certo!
                Meu amigo perguntou.               
                - Você arrisca ir até lá?
                Respondi.
                - Na verdade eu tenho medo dessa polícia, ela é muito violenta, mas se têm feridos e esfomeados vou me arriscar. Não sei onde fica esse acampamento de Balsa Nova, preciso de um mapinha pra não me perder.
                - Olha Zequinha! Tem várias pessoas dispostas a fazer doação, vou pedir que levem essas coisas em três lugares pra você vir pegá-las.
                - Onde serão esses lugares?
                - Na casa das irmãs perto do terminal Sitio Cercado, na Paróquia do Alto Boqueirão e na Associação de Moradores do Xapinhal. Mas, não podemos demorar! Tudo bem?
                - Está certo. Vou arrecadar algumas coisas com algumas famílias da Associação de Moradores Profeta Elias da Vila Lindóia, falar com amigos luteranos que também ajudam e abastecer a Kombi. Prepare um mapinha e já passo ai pra buscar as doações.
                Liguei a TV, passava flashs ao vivo da ação policial. A cena era horrorosa. Pelas imagens dava pra perceber o ódio introjetado nos policiais. A brutalidade proposital, planejada, munição de grosso calibre, bombas sendo lançadas e uma evidente e intrigante emboscada. Uma prática covarde da segurança pública paranaense.
                 O governo do Estado, comandado por Jaime Lerner preferiu entrar pra história como um governo que prefere a força policial ao invés do diálogo. É um erro pensar assim, porque essa atitude nunca resolve, pelo contrário, aumenta os conflitos agrários.
                No rádio um locutor anunciava que todos os acessos ao acampamento de Balsa Nova, onde todos já sabiam que muitos sem-terra fugiram, estavam bloqueados pela polícia. Nem mesmo moradores da região, maioria pequenos proprietários podiam transitar livremente naquela manhã. Nas rádios pedia-se que não saíssem de casa para não serem confundidos com sem-terra. Eu senti medo, deu vontade de desistir da missão, mas não devia. A ideia de pessoas feridas e com fome me deixou emocionado e deveria ir o mais rápido possível.
                Passei nos lugares combinado, acomodei as doações no bagageiro e na carroceria da Kombi, cobri bem coberto, mas deixei fácil de retirar a lona que cobria, pois tinha certeza que seria revistado muitas vezes por policiais. Em pouco tempo apareceu muitos donativos. A Kombi estava bem cuidada, pronta pra viagem e embora fosse mais ou menos duas horas até o acampamento, calculei mais uma hora de embaraços. Peguei o mapinha rabiscado, memorizei e joguei fora. Não queria que a polícia apanhasse esse mapinha no bolso no momento da revista. Recolhi mais algumas informações e parti rumo ao acampamento que não conhecia na região de Balsa Nova.
                Muito movimento na estrada. A medida que se aproximava de Balsa Nova encontrava mais e mais viaturas policiais. Um helicóptero sobrevoava a região. Finalmente sai do asfalto e cheguei na estrada de chão...
               

               

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