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sábado, 4 de abril de 2015

No Paraná é o primeiro

Eu já vi de tudo nessa vida,
Político que lê mau
Jogador perna de pau
Florista que não é jardineiro.
Poeta que não declama
Amante que não ama
Mas governador encrenqueiro
No Paraná é o primeiro

Já vi todo tipo de brincadeira
Boca de forno e cobra cega,
Gringa grigalha e pega-pega.
Esconde-esconde é bom se for ligeiro.
Pular vara e se esconder
Saltar, gritar e correr
Mas brincar com seu dinheiro
O Paraná é o primeiro.

Eu já vi bicho agir de todo jeito
Bode entrar dentro da casa,
Beija-flor que plaina numa asa
E vaca tossir no terreiro.
Já vi gato mamar em cadela
Passarinho dormir na janela
Mas raposa cuidar do galinheiro
No Paraná é primeiro.

Já vi todo tipo de imitação
Falsificar dólar e o real
Trabalhador mentir que passou mal
Até copiaram o canto do vaqueiro
Já vi juiz marcar gol em futebol
Senador guardar propina em lençol
Mas Estado desviar tanto dinheiro
No Paraná é o primeiro

Vi muitas pessoas se enroscar no seu poder
Medico tratar mal um paciente
Advogado que engana muita gente
uma galinha cantar de galo no terreiro
Já vi um rico sair de mão vazia
E a lavadeira derrubar sua bacia
Mas deputado em camburão, muito ligeiro,
No Paraná é primeiro.


Eu já vi todo tipo de nó cego
Comerciante não emitir nota fiscal
Ditador patrocinar um carnaval
E vi polícia trocar multa por dinheiro
Vi mulher casar sem ter amor
Policial soltar bomba em servidor
Mas governador com fama de caloteiro
No Paraná é primeiro.


Eu já vi todo tipo de covardia
Segurança acusar sem ter razão
Deputados se vender por um milhão
Presidente envergonhar um pais inteiro
Já vi os guardas que protegem a cidade
Bater nas pessoas sem dó ou piedade
Mas chamar professor de baderneiro
No Paraná é o primeiro.


Soube de guerra e conflito no Paraná
No Contestado, governo humilhou o camponês
Defendeu a empresa de um inglês
E prevaleceu o mercado madeireiro.
30 de agosto professores e cavalaria
Ainda sofrem nesses vários dias
Mas três poderes massacrar um povo inteiro
No Paraná é o primeiro.

sexta-feira, 3 de abril de 2015

Para o meu amor



Sabe querida,
Eu não sou um bom compositor
Mas resolvi declarar o meu amor
Somos felizes, nenhuma parte sente dor.


Veja amor,
Fico muito triste vendo a massa angustiada
Que saem as ruas invadem praças e calçadas,
Depois retornam a viver a vida inacabada.


Olha amor,
Eu entreguei minha vida à multidão
Que esbravejou muitas vezes sem razão
Mas não adianta, é seu meu coração.


Sabe amor,
Fui operário, boia-fria e outros mais,
Tive calos grossos como pele de animais
Enriqueci muito doutor cortando canaviais.


Olha amor,
Não há outro jeito, tenho que me unir aos companheiros,
Fazer poesia, bater panela, incomodar os fazendeiros
Não se vender de novo pra aquela gente do dinheiro.


Meu amor,
Infelizmente é tão comum a minha rima
E comum é nossa vida, é nossa sina,
Viver unidos como menino e menina.


Meu amor,
Dezesseis anos de casado e muitas felicidades
Mas a sociedade, ela não nos ama de verdade
Ela nos pune por amar e querer igualdade.


Minha querida,
Agora sou poeta, cronista e servidor,
Estou unido a mulheres e homens de valor
Que na arte libertam-se da angustia e da dor.

Minha vida não é minha



A minha vida não é minha
A tua vida não é tua
A nossa vida não é nossa.
É de Deus!
É do povo!

Madrugada, 1:10 min, 31/07/1992, Zequinha.

Uma cadeira vazia



Num recinto muitas pessoas em pé
uma marcou a poltrona
eu não soube porquê.

O Padre falava sobre igualdade
o poeta um canto de paz
e a poltrona continuava vazia.

Num canto uma mesa com flores de plástico
o alarido e o êxtase de pessoas estáticas
celebram a autoridade que passa
ao lado da cadeira vazia.

O professor concentrado na fala aos estudantes
sua mente vagueia noutras dimensões
quando vê por cima dos óculos
uma cadeira vazia.

Em todo lugar há o que aplaudir
tem pessoas de pé
e um assento marcado.

Um ônibus feito doido na via principal
passageiros sobem e descem, e seguem,
assim ou assado, de pé,
frente de uma cadeira vazia.

Onde estará ele ou ela?
Quem falta nesse lugar?
Não sei quem é, mas
o seu lugar está marcado!

Sarau



A ideologia de pensamento do Sarau
É a linha da diversidade
O reino dos costumes e facetas,
Palco de meias mentiras e meias verdades
Culturas de boêmios e ascetas.


Onde se mistura o certo com o duvidoso
Contraria a lei da química-Sociológica
O terreno que pari um grande poeta
Capaz de ressuscitar a maga patológica
Unir culturas é uma meta.


O sarau é o negro pós abolição
Sem o tilintar das correntes nos pés
quase livre de uma forte estrutura
mas receoso de dizer quem é
transforma em arte a vida dura.


Como não reverenciar a cultura cigana
bailando ao som da libertação da mulher
É o espaço vazio de um mundo lotado
O sarau que aguarda quem quiser
sambar sua arte, dançar sua história, dizer seu passado.
 
Há quem entende o brilho da menina
quem emancipa o jovem, a criança,
Há quem brinque com o remédio
quem se fascina com a esperança.
Quem descrimina o tédio

No sarau há tudo que é mais importante
da cultura, da raça, da cidade,
temos a vida e o brilho do arrabalde,
deles que são nossa alma de verdade
aqueles que nos aplaudem.


O grilo adolescente



Todo grilo faz cri-cri-cri
mas o grilo adolescente
faz crá-crá-crá.


Aprendi a gostar de mim


Desde que me entendi por gente
decidi que não iria gostar de mim
eu não suportava a dor de esfomiado
nem a angústia por ter que ficar calado.

Já que era proibido gritar e espernear
que razão existiria para estar vivo?
Não havia ninguém que pudesse socorrer
a solução menos enfadonha era morrer.

Quem podia me ajudar não tinha poder
quem tinha poder não ajudava ninguém
sai então pelo mundo para conhecer
pessoas como eu para juntos viver ou morrer.

Só que a morte que eu queria ter
não era a morte morrida
muito menos a morte matada
queria a morte organizada.

Fui em busca do caminho certo
para chegar onde queria
E tentando fugir da ditadura
enfrentei uma vida muito dura.

Fui preso nas algemas de estruturas
encarei a sordidez e tentei ser esperto
e cada vez que dava um passo a frente
a ilusão do passado puxava de repente.

Andava com mãos e pés amarrados
estava preso com pregos nos pés
mas a prisão era apenas a ideia de sofrer
foi quando me libertei pra ideia de viver.

E num belo dia vi o que deveria ter visto
que ser livre nada tem haver com prisão
mas com o querer buscar a liberdade
Falar, gritar, em todos os cantos da cidade.

No dia que encontrei com minha gente
ganhei a liberdade e sai da prisão
rasguei o peito e acabei com os segredos
então me livrei da angustia e dos medos.

Nessa história de querer ser de verdade
prisão é lugar comum sem ação
cárcere é para os que matam
mentira para os covardes que maltratam.


Tua hora vai chegar



Um dia,
quando menos esperar,
acontecerá algo novo em sua vida.
você dirá: não é pra mim,
eu não tenho a menor chance!

Só que nesse dia tua vida mudará.
e apesar da dúvida aceitará o desafio.
irá se comparar com algo minúsculo,
de tão frágil, pensará em desistir.
 
Contudo, você não irá desistir
não porque não queira,
e sim, porque esse dia está marcado
para ser sempre lembrado em tua história.

Até que de repente, consciente,
você percebe que pode, e vai
erguer a cabeça sacodir a poeira
ir a luta com nunca pensou que fosse.

Então, de minúsculo e frágil
você se transformará, será forte.
como um ser invencível e inteligente
e abrirá o sorriso mais sorrido da tua vida.

Depois da coragem, de enfrentar o desafio
não é mais o resultado bom que irá querer
mas, poder sempre acreditar que você pode
e a vitória então virá, é questão de tempo.

Mas tenha cuidado, esteja em alerta,
a transformação que você sempre esperou
não acontece se você ficar sentada
sozinha, comendo pipoca no sofá.

A grande mudança da tua vida
será a mesma que surge todo instante
mas nem todos vêem, nem percebem
o brilho do sol que irradia a todos.

Portanto, levante a cabeça
junte-se aos que te amam
pois um brilho iluminará teu caminho
e você será a luz que todos esperam.

O Poeta Popular e as regras métricas


        Sobre a critica dos entendidos em literatura, que os poetas populares não respeitam as regras métricas das poesias, poemas e trovas, e por isso teriam menos valor, respondo que é no campo da identidade popular que encontram espaço para expressar a liberdade através da escrita e da arte.
        Compor e declamar desapegado das regras métricas da literatura clássica é um combustível que faz o grupo crescer no número de participantes, ávidos pela liberdade de escrever e falar o que pensam. Por muitos anos, poesias, poemas, trovas, quadrinhas e crônicas, ficaram escondidas dentro das gavetas por causa da regra métrica.
        Quanto ao valor do texto, ele reside dentro da gente e não fora. O aplauso, a venda do material e outros benefícios, são voluntários, mas deveriam compensar o esforço humano na divulgação da cultura que é um bem imaterial e necessário à sociedade, porém, o guia não é o mercado editorial, mas a comunidade de pessoas, de preferência as mais humildes, onde se expressa a liberdade e a capacidade de contribuir na mudança deste mundo aprisionado pelas regras métricas da vida em geral.
        A regra métrica tem o seu valor, mas ela segrega o pertencimento e o apoderamento porque contraria o poder vigente e a regra preestabelecida. 
       Cientes da condição de excluídos das políticas e programas públicos, poetas e escritores populares estão a vontade para escrever poemas, vivenciar a liberdade de expressão e seu saber poético, marginalizado pelas academias de literatura.
        Os escritores e poetas populares estão felizes por não serem obrigado a escrever com destaques nas capas dos livros, a faculdade onde estudou, honrarias recebidas, formação qualificada que possuem, movimentos que atuam, se são ou não conferencistas, quantos pães com manteiga doaram, as moedas que deram no sinaleiro, para ter o respaldo do mercado editorial.
        Estão felizes por não verem revisor extrair textos simplesmente por discordar da opinião em assuntos específicos ou adicionar ideias e opiniões da mente iluminada de senhores do mercado editorial e vender como se fossem pensamentos de um autor. Felizes porque apresentam a sua essência e não sua dependência.
        É claro que há poetas e escritores populares que desejam produzir literatura para o mercado e essa é uma decisão pessoal respeitada, inclusive o Sarau Popular incentiva as pessoas a se aperfeiçoar, estudar, pesquisar, desenvolver as suas capacidades e habilidades, e isso não dá o direito de quem quer seja desqualificar os poetas, escritores e artistas que desejam apenas expressar o conhecimento, a sensibilidade, o ponto de vista pessoal sobre a natureza das coisas, à sua maneira, livre do jugo infame das regras métricas e de seus asseclas.
        Sobre a contribuição do Sarau Popular para a reabertura da Sala do Poeta. Se isso for verdade prevalecerá a ideia de respeito aos diferentes, participação, processo autônomo e coletivo. O Sarau Popular em sua essência é motivação para qualquer evento cultural e lá as pessoas se reúnem para poetizar, não para planejar políticas públicas ou programas governamentais.
        Não há um movimento sequer que não tenha experimentado o sabor amargo de seus erros ou melhor, como afirmou o filósofo Heráclito num de seus fragmentos, sabemos que a agua de um rio não pode banhar o mesmo homem duas vezes. Se no próximo banho for a mesma agua, o que é impossível, o homem não será o mesmo, mas para ficar ainda mais claro essa ideia, busca-se uma arte e uma literatura onde todas as pessoas sejam valorizadas na sua essência, e a cada momento são melhores e mais importante em razão do movimento natural de suas experiências e ideias.
        Não dá pra aceitar os erros do conceito preestabelecido, os erros da crítica clássica que aniquila as letras populares, os erros da segregação, os erros da classe gramatical de uma cidade que julga ser a única que tem razão. Se aceitar calados esse comportamento divisório, haverá uma contradição à natureza do movimento de todas as coisas, que é retomar a sua essência. Portanto, poetas populares vivem sua essência e somos o retorno bom da malfadada cultura classista e elitista.
        Por fim, que sobreviva todos os poetas, escritores e artistas populares; que sobreviva todos os que mesmo não sendo populares respeitam todas as expressões literárias e culturais. Porém, não desejo a mesma sorte aos críticos que não estão nem aí pra qualidade literária e que se preocupam apenas em doutrinar pessoas na defesa da classe dominante.
       Fica claro que a tônica de qualquer modelo de organização é a justaposição de dois lados. Uma moeda tem dois lados e um dos lados é mais preferido que outro. Não temos pra onde fugir. Qualquer texto vai defender um lado, é assim que funciona. Mesmo que o escritor não queira o seu texto estará defendendo ou o lado que separa e diminui ou o lado que une e soma. É assim a sociedade e nela não tem meio termo. Dá pra perceber de qual lado estão os críticos literários que ora se apresentam. O Sarau Popular está do lado de quem une e soma.
       Assim seja! Eu e os venenos da minha língua não gostamos de sepulcros caiados!

Poesia tem nome de mulher

Poesia tem nome de mulher
Poema não tem
Leio-a com emoção
Contemplo-a também.

Noite estrelada
Inspira poesia
Evoca sonhos
Amores e alegria.

Uma melodia perfeita
Da vida à poesia
Faz o coração suar
Mesmo durante o dia.

Quem quer ser melhor do que é
Não conhece poesia
Não vê a força da mulher
E sua ousadia.

A inspiração na poesia
é como a fome e a vontade de comer
comer sem ter fome
não faz o poeta ser.

diálogo sobre Sarau

Numa tarde, o Sarau já terminado

ia pra casa, apressado,
para festejar.

Encontrei um amigo, daqueles
quase desconhecido
e passamos a conversar.

Ele me perguntou, nessa sala
o que rolou?
você pode me falar?

Lhe respondi com alegria
era um sarau de poesia
você pode participar.

Na vila, tem cartazes de montão
tem até no bar do João
é só querer declamar.

Ele me disse: o cartaz eu vi
não fui porque senti
que só alguns podem poetizar.

Nenhuma arte eu sei fazer
poesia então, to pra ver,
um como eu recitar.

Não é que seja proibido,
entrar lá meu amigo,
você há de concordar.

Quantas vezes nessa cidade
teve poesia de verdade
para periferia escutar?

E poeta, então? Vive longe,
é a mesma coisa de um monge
que vive distante a rezar.

Como vou sentar ao lado dos poetas
são pessoas muito corretas
eu nem sei me expressar.

Eu disse: venha assistir,
você vai aplaudir
aquilo que você gostar.

Os poetas são gente boa
são igual qualquer pessoa
que por aqui possa morar.

O meu amigo, não se faz de rogado
esperneou pra todo lado
e continuou a questionar.

Como vou fazer poesia?
vivo mais tristeza que alegria,
tenho mais motivos pra chorar.

Um dia é alguem doente,
noutro, é a cara feia do gerente
prefiro me embebedar.

Então respondi ao amigo
lamento o que acontece contigo
mas, nós somos o poeta popular.

Ele ficou meio desconfiado
olhou pra cima, olhou pro lado
começou pestanejar.

Afirmei então novamente
vai no Sarau, todos ficarão contente,
e tua doença vai curar.

Tem poetas, homens e mulheres,
crianças, adolescentes, do estilo que preferes,
tua mente vai viajar.

Isso posto, o amigo interrompeu,
veja o erro que você cometeu
Poeta mulher? Começo a duvidar.

O que existe é poetiza
ninguém diz "a chuva é uma briza"
e passou a questionar.

Foi como se um espírito inteligente
tivesse povoado sua mente
e eu, de boca aberta a escutar.

Estilos informais e outros da literatura
gramática, métrica, coisas da ditadura,
onde meu barco fui ancorar?


Em que pese, recitar é difícil demais
escrevo poemas clássicos, romances e algo mais
nunca quis publicar.

Mas, o que sinto de verdade,
é o preconceito da cidade
contra a arte popular.

Sou um escravo da rima
sempre quis "em riba" invés de emcima
palavras da minha cultura não posso usar.

Ao meu amigo falei entusiasmado
o Sarau é um espaço sagrado
é só você vir, pode acreditar.

Aqui você pode expor sua convicção
se tua arte vir de dentro do coração
você será aplaudido no Sarau Popular.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

Ser Popular

SER POPULAR

Ser popular é ser como criança, correr como criança,
soltar raia, chamar atenção e não se preocupar;
imaginar ser um herói quando os outros caçoam de nós,
botar apelido e ser apelidado pelos outros.
É esquecer o patinho feio e voar como águia.

Ser popular é cantar no banheiro,
andar na chuva, mesmo que seja pra desentupir a boca de lobo, na rua;
ajudar a vizinha limpar a sujeira da enxurrada
e chorar junto com ela pelo leite derramado.

Ser popular é andar a pé,
fazer calos no calcanhar por causa do buraco no sapato;
é não se importar com a calça desbotada
nem com a gola da camisa quando desfiada.
É gritar de dor na hora de tirar o espinho do pé.

Ser popular é cantar parabéns pra você,
sorrir das piadas sem graça e brincar em festas de crianças;
é dedilhar um violão sem saber tocar,
é agradecer quando alguém faz um favor.

Ser popular é ir a igreja e olhar para todos os lados,
fazer fila para conseguir as coisas;
se acotovelar pra chegar a algum lugar
é pensar que esta fazendo sucesso e sorrir.
ficar feliz, mesmo que seja na aparência.

Ser popular é acreditar na fidelidade,
criar um gato, um cachorro vira-latas e sentir-se protegido;
ou então se sentir acariciado por quem não sabe o que é afeto.
É dividir tudo, inclusive falar com as flores, pelo menos.

Ser popular é confiar nos políticos,
votar, nem que seja por obrigação,
matar a fome com linguiça e pão francês do Brasil,
é pedir a bênção ao padre e ao pastor
e rezar por aqueles que nos torturam e nos matam.

Ser popular é acreditar no guarda,
Pensar que o agente de transito vai te multar,
que soldado vai salvar a cidade
e acreditar que a ditadura já passou.

Ser popular é ir a escola
levar flores pra professora sem querer nada em troca;
brincar de amarelinha no corredor, na hora do recreio,
e não perder o lanche por nada deste mundo.

Ser popular é reformar as coisas velhas
arrancar na marra, as amarras que prendem nossas mãos;
derrubar muros que separam culturas
crer que a união vence a arrogãncia
e que, quando damos as mãos ficamos mais fortes.

De: José Domingos da Silva

Devocionário - siga e não se arrependerá

Jesus é um negro suave.
Filho de Deus mais Deus.
Deus sem Deus é o humano.

Deus se faz pelo “sim”,
se torna libertador pelo “não”.
não permanecer na vida mortal,
A vida mortal que é eterna
Que dura o tempo que a vida vive.
O tempo da eternidade.

No reino que tem reis e quase não tem rainhas
Tem profeta e quase não tem profetisas
Tem apóstolos e não tem apóstolas
que Foi escrito e desenhado por eles
E elas são apenas coadjuvantes.
Muitos homens e poucas mulheres.
Múltiplas, não únicas.

Tudo que é bom nos pertence
Devemos se apropriar
E todo o mal
Devemos rejeitar
Não mandei ninguém o criar.

Nenhum criador pode arrepender-se
De suas criaturas
Uma vez criado, o mesmo, e só o mesmo,
Tem que cuidar e deve cuidar,
Só quem cria conhece como ninguém
A configuração da criatura
Nada dos outros criarem
Cria de outros
Mesmo o Estado.

As novas que devemos seguir
São as boas, que por sua vez,
São inspiradas nas velhas,
E, na maioria das vezes,
São elas próprias.

Os textos, os artigos, as escrituras,
São escritas por muitos
Nunca por um só,
Por isso são sagradas.

Sagrado é toda criatura
Criada para muitos
Para todos
(o contrario do sagrado) é a imitação
Da criatura.
Criada para um individuo.

Deus é sagrado
O mundo é sagrado
A pessoa é sagrada,
Nada  disso,
Nenhuma dessa propriedade,
Foi criada por si só,
Por isso, ainda, por isso
Tudo isso tem sentido,
e vale a pena lutar
para si e pelos outros e
para todos, com os outros,
mas nunca, lutar por si, apenas para si e sozinho.

A angustia e o cansaço
São sinônimos
Da guerra e da dor
O alivio e a esperança
São sinônimos
Da graça e do amor.

Siga e não se arrependerá.

De: José Domingos da Silva

Não quero igreja, quero religião.


Não quero uma igreja
quero uma religião
que me ajude conectar a Deus
ser um escolhido seu
interagir com a força do coração.

Quero uma religião
que de sentido a minha bondade
que apresente um Deus diferente
dos que vêem só os defeitos da gente
e estreita o caminho da felicidade.

Quero uma religião
que me ensine a crer no amor
expresse em mim a confiança
numa eterna aliança
com o Deus forte e criador.

Quero uma religião
que não me puna se diferente pensar
e ensine que a solidariedade
é um caminho para felicidade
e uma razão para viver e amar.
 
José Domingos da Silva

Cordel dos carrinheiros

Amigos e amigas
Que me ouvem nesta hora
Apresento-me a vocês
Serei breve sem demora
Sou passado sou futuro
Meu sobrenome é agora

A historia aqui descrita
Não sou eu que vou contar
Serão dois personagens
Logo vão se apresentar
Dou uma chance a eles
Vamos ver no que vai dar.

Encontrei-os maltrapilhos
Como tantos por ai
Muita sujeira e fome
Fuligem até o nariz
Catando lixo dia inteiro
Alguem pode ser feliz?

O primeiro camarada
Em resumo é um homem
Tem a boca e as pernas
Para não morrer de fome
O chamam de Primão
É grande igual o nome.

O segundo carrinheiro
é mais magro, é andador
caminha rapidinho
diz que assim não sente dor
Alberto é o seu nome
é nome de doutor.

Um branco outro negro
Os dois são maltrapilhos
Comem pouco e muito mal
Água com farinha de milho
De noite, o luar é a riqueza
De dia só tem o sol e seu brilho.

Prepare-se amigo leitor
Um diálogo vai começar
Ouça bem os carinheiros
Eles tem muito o que ensinar
tomam cachaça mas são sabidos
Um dicionário particular.

Alberto:
Obrigado meu amigo
Por você me escuta,
Descupa meu chero forte
Não tenho roupa pra troca,
Mas vejo que tu é humilde
E não vai se importa.

Primão:
Eu também sô assim
Nada mais tenho a dize.
Ais veis a gente se alegra
E esquece de sofre.
Meu carrinho de papel
Testemunha pra você.

Agora
O que quero de vocês,
Meu amigo carrinheiro,
É que me de sua opinião,
Opinião de caminheiro,
Sobre a cidade Curitiba,
essa cidade dos pinheiros.

Alberto:
Ando cidade a fora,
Vejo de tudo meu irmão.
Barraco do lado de casa chique,
Prédio grande e mansão.
Todo mundo põe muro e grade
E engaiola o coração.

Primao:
É tanta riqueza nessa cidade
Nois num ganha o que merece
Os danados dos dinheirista
Roe uma unha enquanto outra cresce
A gente só na pindaíba
Vive ruim mas não entristece.

Alberto interrompe Primao:
Deixa eu dize uma coisa
Do fundo do coração
Saimo madrugadinha
Pra chega antes do caminhão
Tomamo um gole de cachacinha
Que é pra guentá o rojão.

Diga você que é estudado
se é possível de marchá
por esse asfalto duro
que nossos pés dana rachá
não temo café da manhã
nem como se alimentá.

Primão:
Pra enche um carrinho desse
É preciso sair cedão.
Se sai com o sol alto
A gente perde pro caminhão,
Agora tu já pensou,
Como é duro nosso pão?

Agora:
Agora digam por favor,
O que é mais fácil pra se acha.
Papel pra encher carrinho
Ou um litro de cachaça.
Essa pinga na mão de vocês,
É comprada ou vem na faixa.

Alberto:
Nois vendemo os papel,
E juntamo uns tostão.
Depois em qualquer boteco
Tem pinga de garrafão,
Cachaça de graça pra nois,
Aqui tem disso não.

o caminhão sempre cata
o melhor papel que tem
já tem até gente rica
catando papel também
pelo menos pra cachaça
não falta nosso vintém

Primão:
O papel que a gente junta
Eu nem sei quanto é de dá.
Pelo menos a cachaça
A gente pode comprar,
E quando o lixo é bom
Sobra um pouco pra guarda.

nois compramo essa mardita
não é na faixa não
Ninguem confia em nóis
fiado nem o feijão
carrinheiro em Curitiba
sofre desfeita de montão.

Agora:
Vocês crêem em Deus ou algum santo?
acreditam em religião?
Todas as pessoas do mundo
vivem de fé ou de ilusão
eu creio que Deus existe
vocês crêem na compaixão?

Alberto:
te garanto, nada sei
do negocio de religião.
Gente boa já encontrei
E gente ruim tem de montão
Acredita que outro dia
Ma chamaram de ladrão!

Só porque mexia no lixo
que vai pro caminhão.
Nunca roubei nem matei
porque tanta judiação
Se ganho comida devolvo o prato
Eu sou um bom cristão.

Agora:
Eis aí prezados leitores
que nesse texto se atem
a visão de dois carrinheiros
que andam o dia inteiro
pra ganha pouco vintém.
Esse povo é sofredor
Excluído da sociedade
resgatar seu valor
Em Curitiba ou onde for
é nossa responsabilidade.

Agora:
vou parando por aqui
mas deixo algo a pensar
nesse dia do mês e ano
vamos se organizar
um fórum de discussão
nós podemos começar
pra fazer justiça à arte
e a cultura popular.

De: José Domingos da Silva (Bate papo com dois carrinheiros)

Síndrome do domingo a noite

Domingo a noite
Tenho que sair por aí
Assistir uma peça de teatro
Nem que seja no Teatro Paiol ou
No tablado do Parque São Lourenço.
É a fuga da minha síndrome.

De: José Domingos da Silva

Crônica do pedágio

  Juvenal seguia para a praia de Guaratuba e parou na Praça de Pedágio. Olhou para a cobradora e disse:
            - Eu não tenho dinheiro.
            - Como?
            - Eu não tenho dinheiro!
            - Então o Senhor não pode passar.
            - Como não posso passar?
            - O Senhor, sendo motorista, deve saber que o pedágio é obrigatório nessa estrada.
            - Sim, eu sei. Mas eu não tenho nenhum dinheiro e preciso ir até a praia.
            - Como o Senhor vai até a praia sem nenhum dinheiro?
            - O único dinheiro que tinha gastei em combustível.
            - Então o Senhor aguarda um instante que um funcionário da concessionária vai atendê-lo.
            - Sim Senhora!
            Logo chegou o funcionário e disse-me:
            - A cancela vai abrir, o Senhor estaciona naquele canto.
            - Tudo bem!
            Atravessei a cancela e estacionei no canto ordenado.
            Logo apareceu mais um funcionário e passaram-me a interrogar.
            - Senhor, o pagamento de pedágio é obrigatório e nenhum carro pode passar sem pagar a taxa.
            - Eu sei que é obrigatório, mas eu não tenho dinheiro.
            - Então, lamentavelmente, o Senhor terá que retornar.
            - Só porque não tenho dinheiro pra pagar o pedágio?
            - Sim Senhor!
            - Lamentavelmente, eu não posso retornar. Tenho uma hora pra chegar até Guaratuba.
            - Se o Senhor transportasse uma pessoa doente ou houvesse algo grave que pudéssemos ver, deixaríamos o Senhor passar.
            - Pois bem! Felizmente não transporto nenhuma pessoa doente e graças a Deus não há nenhum problema grave, nem com minha pessoa nem com meu automóvel. O único problema é que não tenho dinheiro para pagar o pedágio.
            - Se o Senhor vai para praia, como poderá se divertir sem nenhum dinheiro.
            - A diversão é opcional e têm muitas alternativas de diversão na praia.
            - Mas o Senhor teve que encher o tanque do carro. Fez isso sem dinheiro?
            - Não! Mas pude escolher o posto de gasolina mais barato e economizar.
            - Olha Senhor, quem não tem dinheiro não vai a praia.
            - Negativo. A praia aceita todas as pessoas. As que têm e que não tem dinheiro.
            - Quero dizer, Senhor, que pra ir á praia é preciso ter dinheiro para cobrir alguns gastos obrigatórios, por exemplo, o pedágio.
            - Sim, mas todos os gastos me apresentam alternativas de escolha e formas de pagamento... Queria ir por outro caminho, mas o único que existe é esse.
            - Lamento, mas o Senhor terá que retornar!
            - Eu não posso retornar, tenho que seguir até a praia.
            - Então terei que chamar a Polícia.
            - Acho melhor!
            Tomei um cafezinho de uma garrafa térmica, e depois de um tempo chegou uma viatura da Policia Rodoviária, com dois policiais.
            - O que se passa?
            - Esse cidadão vai a praia e não quer pagar o pedágio. Ele já afirmou que não há ninguém doente no carro e não tem nenhum problema aparente que justifique a isenção da taxa.
            - Porque o Senhor não que pagar?
            - Porque não tenho nenhum dinheiro.
            - Mas o Senhor sabe que a taxa de pedágio é obrigatória e o não pagamento pode implicar em multa.
            - Sim, eu sei. Mas eu não tenho nenhum dinheiro, tenho que chegar a praia e este é o único caminho por onde posso ir.
            - Sabia que poderíamos prendê-lo?
            - Mas, e as outras pessoas que estão no carro. Também serão presas?
            - ficariam detidas?
            - Só porque não tenho nenhum dinheiro?
            - Não! Porque o Senhor se omite em pagar a taxa obrigatória.
            - Senhor guarda! O dinheiro que tenho está contado. Um tanto pra comida, outro pra bebida, outro para o combustível de volta.
            - Porque não contou com a parte do pedágio?
            - Porque as despesas que citei são necessárias e posso escolher o valor e o local de adquiri-las!
- Pois bem, o pedágio é uma lei e o Senhor terá que cumpri-la. Senão terei que multá-lo.
O funcionário perguntou:
            - Senhor guarda. E quem vai pagar a taxa de pedágio?

De: José Domingos da Silva